Mais de 1000 espécies de fungos na Lista Vermelha de Espécies ameaçadas da IUCN

O número de fungos na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN ultrapassou hoje as 1000 espécies.

27 março, 2025≈ 5 mins de leitura

Cyanoboletus poikilochromus

© Federico Calledda

O número de fungos na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN (do inglês “International Union for the Conservation of Nature”) ultrapassou hoje as 1000 espécies, e confirma que a desflorestação, a expansão agrícola e o desenvolvimento urbano estão a conduzir à extinção muitas espécies de fungos em todo o mundo.

A Lista Vermelha da IUCN inclui atualmente 169 420 espécies de animais, plantas e fungos, das quais 47 187 estão ameaçadas de extinção. A adição de 482 espécies de fungos recentemente avaliadas eleva o número de fungos na Lista Vermelha da IUCN para 1300, dos quais pelo menos 411 estão em risco de extinção. “A vida na Terra depende dos fungos, mas até agora eles têm sido largamente ignorados. Graças à dedicação de cientistas e cidadãos cientistas ao longo da última década, mais de 1000 das 150 000 espécies de fungos conhecidas no mundo foram agora avaliadas para a Lista Vermelha da IUCN, a fonte mais completa de informação sobre o risco de extinção. Agora, este conhecimento deve ser aproveitado para proteger o reino único dos fungos, cujas redes subterrâneas sustentam os ecossistemas em todo o mundo”, afirmou a Dra. Grethel Aguilar, Diretora-Geral da IUCN.

O MyCoLAB do CFE participa neste esforço coletivo, sendo responsável pela avaliação do risco de extinção de mais de 80 espécies de fungos, cerca de 60 das quais publicadas na presente atualização. Desde 2019 que o MyCoLAB avalia espécies de fungos para a Lista Vermelha da IUCN. Mais recentemente, no âmbito do projecto de doutoramento de Susana P. Cunha, financiado pela FCT na Universidade de Coimbra e nos Jardins Botânicos de Kew, no Reino Unido, e em colaboração com o Comité para a Conservação dos Fungos da IUCN, o MyCoLAB está também envolvido em análises compreensivas do risco de extinção em certos grupos de fungos e no desenvolvimento de ferramentas para acelerar a inclusão de fungos na Lista Vermelha. “Continuam a ser urgentemente necessárias mais avaliações para identificar e mitigar os riscos de extinção enfrentados pelos fungos”, afirma Susana P. Cunha.

A redução e a degradação contínuas do habitat devido às ameaças e pressões sobre as florestas mediterrânicas empurram espécies de fungos raras e associadas a árvores da família das Fagaceae, principalmente carvalhos, como o boleto Cyanoboletus poikilochromus para a categoria “Vulnerável” à extinção, concluiu a análise levada a cabo por Susana P. Cunha e Susana C. Gonçalves sobre esta espécie. “Com um número de espécies estimado em 2,5 milhões das quais cerca de 155,000 descritas para a ciência, os fungos desempenham um papel fundamental no funcionamento dos ecossistemas naturais. Por exemplo, mantêm a fertilidade do solo pela decomposição da matéria orgânica morta e facilitam a tomada de nutrientes através das associações micorrízicas que estabelecem com as raízes da esmagadora maioria das espécies de plantas, contribuindo para o sequestro de carbono. Para além disso, a recolha, uso e comércio de cogumelos silvestres é uma atividade económica relevante.”, explica Susana C. Gonçalves. “Assim, ao perdermos os fungos, perdemos também os serviços que eles prestam. É crucial proteger os habitats naturais ricos em diversidade fúngica, como são as florestas autóctones ricas em carvalhos, mas também é preciso gerir as florestas de produção e pensar as práticas de restauro ecológico considerando os fungos, por exemplo, mantendo árvores vivas e madeira morta.”, acrescenta.

Em Portugal não foi ainda feita a avaliação do estado de conservação dos fungos, mas a Lista Vermelha global coloca muitas espécies de fungos em categorias de ameaça. Algumas destas espécies, como o Cyanoboletus poikilochromus, ocorrem em território nacional. De acordo com as especialistas do MyCoLAB, por precaução, seria desejável incluir estas espécies em instrumentos de legislação nacional de proteção da biodiversidade como seja o Cadastro dos Valores Naturais Classificados que se encontra em preparação. Por outro lado, é urgente que os responsáveis pela proteção da biodiversidade em Portugal reconheçam os fungos como um dos grupos em que existem lacunas de informação e apoiem a elaboração de uma primeira lista vermelha nacional de fungos. “Os fungos constituem o seu próprio reino, distinto de animais e plantas, mas enfrentam as mesmas ameaças. É tempo da política para a conservação visar toda a diversidade macroscópica: a fauna a flora e a funga”, conclui Susana C. Gonçalves, coordenadora do MyCoLAB.

Mais informações.

No âmbito do projeto de ciência cidadã “Cogumelos na Cidade” dinamizado pelo MyCoLAB (https://www.inaturalist.org/projects/cogumelos-na-cidade), foram encontradas duas espécies classificadas como “Vulneráveis” na lista vermelha global: o boleto Alessioporus ichnusanus e a língua da terra Microglossum atropurpureum encontram refúgio nos fragmentos remanescentes de habitats naturais e semi-naturais que ainda persistem no perímetro urbano da cidade de Coimbra.

A. ichnusanus é uma espécie rara que cresce em florestas mediterrâneas associado a carvalhos de folha perene e de folha caduca, cujas principais ameaças são os incêndios, o abate de árvores e o corte de madeira, bem como a degradação do habitat devido a atividades humanas. Já M. atropurpureum é uma espécie de prados semi-naturais principalmente calcários, sobretudo nas terras baixas. Estes habitats estão em declínio devido à alteração das práticas agrícolas, a projectos de desenvolvimento, à exploração mineira e à poluição. A descoberta destas espécies no âmbito do Cogumelos na Cidade ilustra que as bolsas de natureza que persistem nalgumas zonas urbanas e periurbanas, contendo habitats naturais e semi-naturais, são valiosos repositórios de biodiversidade nativa e devem ser protegidos.

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